O trabalho na obra de reforma do Complexo Municipal de Morro da Fumaça decorria normalmente na manhã da última terça-feira, 16, quando o pedreiro, Esveraldo Brasilicio, percebeu que existia algo importante entre os pedaços de madeira que removia da parte que corresponde ao antigo plenário da Câmara de Vereadores, que fica no edifício anexo ao prédio da Prefeitura.
“Estava removendo as tábuas e de repente estava ali, em pé na face da parede. Essa estrutura era tipo um tablado de madeira. Assim que vi, parei o trabalho, e peguei o papel para ver o que era. Foi uma surpresa!”, relata Brasilicio.
A demolição de parte da estrutura interna do prédio da Câmara de Vereadores é uma das etapas da reforma e revitalização do Complexo Municipal, iniciado em maio de 2023. Além de sanar problemas estruturais, o projeto tem como um dos objetivos principais realizar adequações voltadas à acessibilidade. Construída na década de 60 e inaugurada em 1970, a estrutura, desde então, passou somente por pequenas reformas, sendo a última em 2012.
“Os trabalhos começaram pela reforma do prédio da Prefeitura, agora, as atividades se concentram no prédio da Câmara de Vereadores. Neste primeiro momento, estamos trabalhando de cima para baixo, com a remoção de telhas e madeiras que não podem ser reaproveitadas, devido à degradação. Toda a madeira que circunda o plenário foi removida para que aconteça a adequação do aspecto da acessibilidade. Precisamos fazer um nivelamento, pois na estrutura antiga havia um estrangulamento nos acessos da Casa”, explica a engenheira civil, Caroline Crozeta Deghenhard.
Conforme a engenheira esta é a primeira vez que é surpreendida com a informação de que foi encontrado algum elemento histórico ou estrutura que não consta no projeto em obras sob sua supervisão. “Trabalhamos com a premissa de que qualquer detalhe fora do previsto seja reportado ao engenheiro responsável pela obra, para que seja adotado o melhor encaminhamento. Assim que tomei conhecimento do que se tratava, busquei garantir que o item fosse preservado e comuniquei a Administração Municipal”, esclarece.
Com a assinatura devidamente reconhecida pela Administração Municipal, o documento, conforme o prefeito, Agenor Coral, é um achado histórico que será preservado e incluído na galeria do hall de entrada da Prefeitura. “Isso faz parte da nossa história e deve receber o tratamento que merece. Desde o início das tratativas para a reforma defendi a preservação das características antigas da obra. Esse achado só reforça que fizemos a escolha certa. Vamos encaminhar o elemento para que seja feito o trabalho de restauro e preservação, para que depois possa ficar exposto na galeria da sede administrativa”, detalha.
Datado de 1º de janeiro de 1969, o documento é assinado pelo segundo prefeito de Morro da Fumaça, Jorge Silva, o primeiro eleito, entre as 16 administrações apontadas para comandar a municipalidade. A carta, escrita à mão, com caneta de cor azul, em um pedaço de papelão, faz um registro histórico vivenciado pela cidade e elenca o nome das principais autoridades da época.
“Sou apaixonado por cultura e pela história de Morro da Fumaça, estar vivenciando este momento nos emociona, é algo que precisa ser compartilhado com toda a população fumacense. Cabe a nós, atuais gestores do município, resgatar essa memória e preservar o legado de quem passou por aqui e ajudou a construir a história do nosso município”, pontua o vice-prefeito, Eduardo Guollo.
O hábito de fazer registros históricos, conforme a família, era um hobby de Jorge Silva. Segundo Rodney Félix Silva Júnior, um dos netos do ex-prefeito, a carta encontrada no edifício do legislativo fumacense é apenas uma de várias que o político deve ter deixado pela cidade.
“Que incrível! O vô fazia isso em muitas coisas. Ele tinha o costume de fazer essas cápsulas do tempo. Ele fez isso na minha frente, pegou um pedaço do jornal do dia e colocou na parede do antigo cartório, onde hoje é uma sala comercial. Acredito que ele deve ter feito isso em outras obras em que participou do processo de construção ou reforma. O vô era muito culto, gostava de preservar a história, e deve ter feito isso com o objetivo de transmitir a informação para as gerações futuras e deixar registrado o trabalho que se teve para desenvolver o município”, comenta.
Filha do ex-vereador e ex-prefeito, Getulio Pagnan, um dos nomes citados na carta, Rosângela Pagnan Maragno, a Danda, atual diretora do Departamento de Cultura do município, rememorou algumas lembranças ao ler o documento. “De certa forma estamos revivendo aquele momento. O Jorge Silva, a exemplo de diversas outras lideranças do nosso núcleo político, sempre trabalhou pelo desenvolvimento da cidade. Estar aqui, hoje, dando continuidade a esse esforço é muito gratificante”, compartilha.
Além de prefeito de Morro da Fumaça, entre os anos de 1963 a 1969 e 1977 a 1983, Jorge Silva foi fundador e primeiro presidente da Cermoful, participou da construção da igreja matriz de Morro da Fumaça, fundou o Hospital de Caridade São Roque e foi um dos responsáveis pela implantação da primeira escola pública do município. Jorge Silva, faleceu em fevereiro de 2011, aos 84 anos.
Confira a transcrição literal do relato histórico:
“Este edifício foi construído na gestão do prefeito Jorge Silva começado em março de 1967 e terminado em 31-1-1969.
Sendo governador do estado o Dr Ivo Silveira. Presidente da República Marechal Arthur da Costa e Silva. Presidente da Câmara Municipal Lyrio Frasson.
Vereadores
Getulio Pagnan
Antonio Maccari
Miguel Novacoski
Otavio Naspolini
Alberto Padoin
Vigário da Paróquia.
Monsenhor Ludgero Watekemper
Juiz de Paz
Verginio Maccari
Delegado de Polícia
Antonio Silva
Foi progetado pelo arquiteto Antonio Jorge Carneiro
Foi construtor responsável o Sr. Euclides Piva
Escrita do dia 1-1-69 nos poucos minutos que estive em visita a obra
Jorge Silva
Prefeito Municipal”.